A Lucidez.

"É difícil aprisionar os que têm asas"

Caio Fernando Abreu

Eu tenho muito medo da lucidez que toma conta de mim em alguns dias. Ela chega de repente e se instala como uma posseira dentro da minha cabeça e toma conta dos meus olhos. Às vezes, eu nem sei que é ela, vou descobrir muito tempo depois. Nos dias de inverno a lucidez adora me visitar. Você pensa que ela telefona, manda algum recado, ou ao menos avisa que vai subir até o meu apartamento?
Ela é completamente abusada, ela chega. Eu começo a sentir um peso nas minhas palavras e meu olhar para o mundo muda completamente. A poesia vai embora. Muitas vezes eu me perguntei se ela me visita mais no inverno, nos dias frios. Depois pude observar que não é isso, ela esfria e nubla tudo em mim.
É um sentimento interno tão poderoso e devastador, para mim, que fico quase imobilizada. Algo entre o pânico e a angústia de viver. Uma intolerância com as pessoas, uma vontade de ficar muda e de não responder perguntas. A lucidez é muito amiga da intolerância.
Eu sei que a lucidez é muito necessária na vida, porém há de ser sábio para ter sua companhia.

Eu não tenho sabedoria para conviver com ela. Quando ela chega com sua capa de veludo vinho e eu percebo que ela invadiu meu olhar e paralisou minhas atitudes, vem sempre aquele pensamento:

“Essa lucidez tá danada, não me deixa fazer mais nada”.

Denise Portes