domingo, 17 de junho de 2018

Texto Júlia Portes

Eu tô sentada em um sofá que não é da minha casa e tem um quadro de montanhas na minha frente, eu as vejo, as outras pessoas não sei.
Me transporto pra dentro do quadro e sinto o vento batendo no rosto, o gramado e as mãos dadas com outras mãos.
Uma festa acontece ao meu redor e eu abro aquele livro que você me deu de presente, você não comprou pra mim, mas indicou e livro bem indicado é presente grande.
Eu li 111 vezes assim como você disse que seria, e agora tá inteirinho sublinhado.
Quando a gente sublinha todas as palavras a importância se perde ou se multiplica?
Abro numa página qualquer 
Todas as pessoas tem o mistério do quadro de Monalisa. Essa é a frase anotada.
Tem tanta gente ao meu redor agora e a música é boa, as palavras tocam instrumentos e me dá vontade de ler um texto no meio da festa. 
Seria inconveniente - ou bonito. Eu devia arriscar.
O pensamento divaga.
Me lembro da briga que tive na terça 
Da conversa que me levou pra fora do tempo-espaço com um amigo que entrou coincidentemente, ou não, no mesmo ônibus. 
Do texto recebido às 2h da manhã que revirou a semana, o mês, o ano 
De como aquela menina de 15 anos escreve como se tivesse 55.
Da vontade de ser terra fértil 
Da alegria de encontrar tantas terras férteis 
De achar a Copa uó
Das mensagens que vou receber amanhã 
Dos trabalhos da semana
Da vontade de ter um tabaco apertado entre os dedos agora
Da vontade que você estivesse aqui agora
Do aprendizado que é você não estar
Da alegria que é estar sozinha e tão bem acompanhada por mim
Do vazio que eu raramente consigo preencher
Da sensação que é buscar
Dos reencontros da vida
Sofro uma ruptura pela música novavelha que começa: " vou mostrando como sou e vou sendo como posso, jogando meu corpo no mundo..."
Um amigo passa a mão no meu cabelo
Fico feliz que ele esteja longo, estou sentindo como se fossem fios-raízes
A materialização de metáforas 
A festa continua
Re-olho o quadro
Pintar mais e nos pendurar mais por aí 
Quero te dar um quadro de presente.

Júlia Portes

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