sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Texto Irene Niskier

Tios Max e Jean-Paul, preciso dizer que falhamos.
Intuitivamente, diria que "Nunca esquecer" é a expressão mais repetida por judeus de todas as filiações religiosas desde o Holocausto. Hoje, no Brasil, nossa pequena comunidade falhou porque esquecemos.
Tios, repetimos o conto do seu fim: vocês foram aqueles que não voltaram de Auschwitz quando de seus 12 e 10 anos de idade. Mas esquecemos o caminho que a Europa percorreu para que de crianças se fizesse pó. A História do Holocausto não é a estória das câmaras de gás. É a História da construção da legitimidade do uso da violência contra aqueles considerados menos dignos do reconhecimento como pares humanos. Peço que perdoem o academicismo, é a linguagem que aprendi nos livros para organizar a desordem do mundo na mente e no peito. É como dou sentido a dor de minha avó, sua irmã, sobrevivente do horror que esquecemos. O número sabemos de cor: foram 6 milhões de judeus mortos, 1 milhão destes eram crianças. Gente que virou pó que virou número. 
Antes da morte, contudo, houve a fome, o trabalho forçado, a fuga para quem pode. Antes ainda, a estrela amarela, o gueto, o desemprego. Antes, o estigma, o humor depreciativo, as teorias da conspiração. A História não acontece em saltos, tios, vocês sabem.
Aqui no Brasil de 2018, não sei se esquecemos ou se nunca soubemos. Não gosto de exercícios premonitórios, desconheço nosso futuro, mas quando identifico os sinais, entendo os riscos. Eu não os aceito, os riscos, os gigantes riscos. O povo alemão em 1932 não entendeu e hoje amarga a memória de seu passado. Tivessem entendido, eu não conversaria com a tela em branco. Seus filhos e netos seriam meus interlocutores

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